Nos meus atendimentos recebo, entre muitas demandas, um número expressivo de pais separados em busca de atendimento psicológico para seus filhos que apresentam dificuldades comportamentais e emocionais.
Neste momento faço uma reflexão com o intuito de compreender a postura dos pais frente a separação e como esta influencia diretamente o desenvolvimento da personalidade dos filhos.
A separação de um casal não é fácil e simples. É um processo doloroso e que traz sofrimento para todos. Na verdade é um luto a ser vivido e elaborado. A decisão da separação representa, entre muitos fatores, lidar com as expectativas que foram projetadas no outro e no ideal de uma família “feliz”, sem problemas.
No entanto quando estas expectativas são frustradas e não ocorrem como “planejadas”, surge a frustração. Se o casal não consegue identificar profundamente o que acontece e se não consegue transformar a problemática, corre o risco de escolher caminhos equivocados, como: continuar juntos e reclamando um do outro até que a morte os separe ou decide por se separar em vida com a intenção de pôr fim a um sofrimento.
A decisão de um casal continuar junto e infeliz ou de se separar e não elaborar esta separação, afeta diretamente no desenvolvimento saudável da personalidade dos filhos, demonstrando muitas vezes a imaturidade do casal em lidar com os próprios conflitos.
Há casais que mesmo infelizes optam (conscientemente ou inconscientemente) em ficarem juntos. O problema é quando decidem isso usando os filhos como desculpa, ou seja, trazem argumentos que ressaltam que não podem se separar porque não querem que os filhos vivam sem uma “família.” Claro que no fundo do coração, os filhos também querem uma família, mas uma família onde os pais vivam realmente bem ,felizes e integrados entre si. Neste contexto os desentendimentos são até pedagógicos e realistas onde os filhos aprendem, através dos pais, que apesar de às vezes os pais terem opiniões diferentes isso não significa que eles não se amem. Assim, os filhos sabem que podem pensar diferente, mas que nem por isso os pais vão se separar deles.
O casal infeliz que opta em ficar junto na fantasia de não trazer sofrimento para os filhos, na verdade transfere aos filhos a responsabilidade da falta de coragem de tomar a decisão que é do casal e não dos filhos. Estes querem conviver com os pais, mas pais que se amem e não pais que vivem juntos em um ambiente de brigas, mágoas e de instabilidade.
Por outro lado há casais que resolvem se separar, mas quando não elaboram essa decisão podem trazer prejuízos para os filhos. Isso acontece na medida que os mesmos são usados numa “briga” que não terminou com a separação. Agora o problema é passado para os filhos, evidenciado em situações por briga por pensão e/ou guarda dos filhos. Também surgem acusações de alienação parental ou acusações sobre como os filhos voltam “diferentes” da visita à um dos conjugues, além de outros relatos que colocam os filhos numa situação muito difícil. Claro que estes casos devem ser investigados e se as acusações forem reais devem ser tomadas as providencias de proteção aos filhos. Estas acusações sendo reais ou não, demonstram, da mesma forma, que os filhos são vítimas de pais imaturos e que não aceitam a frustração de uma separação .
Desta maneira os filhos podem trazer a culpa pela separação, pelas brigas atuais ou ficam confusos com a decisão dos pais que decidiram pela separação para viverem melhor, mas que ainda continuam com atritos, então percebem que nada mudou.
Pais juntos ou separados, mas infelizes, contribuem para que os filhos também sejam imaturos e que também durante a vida não consigam lidar com as frustrações. Além disso, os filhos podem desenvolver: sentimentos de insegurança, instabilidade emocional, auto estima rebaixada, agressividade, dificuldades de socialização , baixo aproveitamento escolar e/ ou sintomas físicos.
Penso que de forma geral não é a intenção consciente dos pais de magoar os filhos, mas para que isso não aconteça os pais precisam respeitar os próprios desejos, os próprios sentimentos e se apropriarem deles para não projetarem nos filhos as demandas que são deles e não dos filhos. É preciso uma atitude madura frente a decisão.
Desta forma se a separação de um casal é realizada, apesar do sofrimento da decisão, de forma consciente e segura, esta decisão é passada da mesma forma para os filhos, ou seja, a menos traumática possível. Os pais e os filhos passarão pelo luto, mas terão condições de superar. Todos poderão aprender a lidar com a frustração de uma situação idealizada e que não aconteceu. É a possibilidade de transformação de uma decisão difícil.
Assim, os filhos terão chances de refletirem sobre si mesmos e projetarem o menos possível suas demandas nos próprios pais ou nos próprios filhos que por ventura possam ter. Esta reflexão surge na obra de Jung quando ele diz sobre as influências transgeracionais em nossas vidas e o quanto essas nos afetam. Portanto, o autoconhecimento dos pais é de extrema importância no desenvolvimento saudável da personalidade dos filhos, principalmente para que os pais não projetem a vida não vivida deles na vida dos filhos e para que estes não façam o mesmo com as próximas gerações.