Casamento e a Psicologia Junguiana

Casamento é uma relação para ser vivida, onde cada cônjuge deve estar disponível para a manutenção da relação, por meio do diálogo e da confiança. Lembrando que cônjuge é aquele que irá conjugar os verbos, que são as ações da vida psíquica, biológica, social, espiritual, profissional e social com o seu/sua parceiro/a, em todos os tempos e modos. Porém, devido à falta de autoconhecimento, geralmente acabamos buscando em nossos parceiros as compensações ou complementações das nossas dificuldades, o que pode gerar decepções ou paralisias futuras, abalando a confiança. Onde confiança equivale ao fiar com, ou seja, tecer a trama do viver juntos, numa parceria em direção à realização existencial de cada um.

O amor, por sua vez, deve ser a base. Porém, é importante deixar claro que ninguém pode dar o que não tem, mas consequentemente, também não poderá receber o que não pode dar. Isso é fundamental, porque nossa tendência é a de buscar no outro o que não conseguimos encontrar em nós mesmos. Aí, acusamos o outro ou desejamos modificar o outro, sem percebermos que se desejamos mudar nosso destino, toda transformação pretendida deve acontecer, primeiramente, em nosso íntimo.

O mais comum é que cada indivíduo acaba projetando no seu parceiro alguns dos seus aspectos sombrios e, ao mesmo tempo, acaba despertando no outro algumas identificações, igualmente projetivas, que fazem parte do jogo das atrações ou repulsões do encontro amoroso. O interessante é que, na maioria das vezes, as pessoas se encantam muito mais com os conteúdos projetados e idealizados do que com a realidade. É um jogo de luzes e sombras onde cada parceiro acaba “comprando” o que quis ou pode ver dos conteúdos projetados no outro. O problema é que, muitos encontros acabam produzindo alianças e daí surgem as decepções mútuas. Porque, no convívio, cada companheiro quer receber o que imaginou ter visto e “comprado” no outro, transformando-o em devedor, muitas vezes sem perceber que também é devedor de algo que não pode ou não tem para dar.

Por isso afirmo que a relação mais difícil de termos é com nós mesmos e depois com os nossos credores, aqueles que “compraram” de nós algo que não podemos ou não temos para dar ou que, pelas mudanças naturais da vida, não queremos continuar dando. Nesse momento é que surgem as crises, pois nos sentimos tolhidos, aprisionados e impedidos de fazer mudanças. Na realidade, todos nós usamos máscaras (personas) para nos apresentar de uma maneira que consideramos mais favorável, devido às influências familiares, sociais, entre outras. E, neste sentido, os amantes só poderão se encontrar de verdade quando forem suprimidos os véus, ou, usando a terminologia junguiana, quando houver o desnudamento das personas.

É interessante notarmos que quando um homem resolve casar com uma mulher, no seu íntimo, ele deseja que ela não mude em nada. Bem diferente das mulheres que se casam desejando, no seu íntimo, que aconteça muitas mudanças no futuro marido – mais atenção, presença, maturidade, cumplicidade.

Essa realidade é um dos principais fatores para os fracassos conjugais, principalmente depois que a mulher vira mãe! Porque a experiência da maternidade, que é um marco significativo na vida das mulheres, faz com que seus instintos maternais fiquem totalmente aflorados, bem diferentes dos homens que, na maioria das vezes, se sentem inseguros e até deixados de lado por conta da relação entre a mãe e o bebe.

Como nossa sociedade está muito competitiva, iludida com os avanços tecnológicos e voltada para as conquistas materialistas do patriarcado, se torna muito comum vermos casais transformarem suas relações numa extensão dessa realidade. Ou seja, deixam de lado o investimento matrimonial, que deveria ser o exercício da alteridade, onde cada um pode aprender a ver-se com os olhos do outro, colocando de lado o próprio umbigo para engajar-se na realização do seu parceiro. Condição necessária para o casamento poder resistir às mudanças e demandas naturais, tanto das partes quanto do entorno existencial. Desta forma, um casamento saudável exige cumplicidade e foco na realidade, para que as idealizações fiquem de lado, como nesta frase que tirei do filme Colcha de Retalhos: “Os jovens amantes procuram a perfeição, velhos amantes aprendem a arte de unir retalhos e descobrem a beleza na variedade das peças…”

WALDEMAR MAGALDI FILHO, Psicólogo, especialista em Psicologia Junguiana, Psicossomática e Homeopatia. Mestre e doutor em Ciências da Religião. Autor do livro: “Dinheiro, Saúde e Sagrado”, coordenador dos cursos de especialização em Psicologia Junguiana, Psicossomática, Arteterapia e Expressões Criativas e Psicologia Integrativa Transpessoal oferecidos pelo IJEP – Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa – wmagaldi@ijep.com.br