O ‘TEMPO’ fez muitos pensadores tentarem entendê-lo e creio que as palavras nunca conseguirão explicá-lo. Para Isaac Newton, era um fluxo objetivo mensurável no mesmo nível que uma montanha ou um território, mas Einstein o evidenciou como uma forma de relação. Seja como for, precisamos desse símbolo ‘TEMPO’ a fim de conscientizar-nos dos ciclos que se fecham em nossas vidas. A vida se escoa como se fosse eterna para cada um de nós, mas os ciclos nos obrigam a perceber a finitude. Junto a cada um deles, vem a consciência do existir e do abandono do passado se posicionando no presente com os olhos no futuro.
Os anos, meses, dias, horas, minutos e segundos são convenções, unidades de contagem do tempo que utilizamos para esperar Átropos, a deusa que ninguém consegue aplacar quando é chegado o momento da própria morte, enquanto Láquesis, como a anterior, deusa do destino na mitologia grega, puxava e enrolava o fio tecido, distribuindo a cada um de nós as atribuições de cada vida e, assim, definia o nosso destino. Vamos vivendo repetidas vezes os ciclos convencionados para medir o quanto permanecemos convivendo com os mistérios, pois a impressão que temos é a de que um dia desvendaremos todos os segredos do universo, como quando acontecia antes de nascer nossa consciência.
A alma bruta, o inconsciente coletivo, que corresponde à prima matéria alquímica, tal qual uma semente, vem com todo o potencial para sofrer uma transformação no “TEMENOS”i que é o mundo. Essa alma jovem, depois de experimentar o conhecimento do universo separado em opostos, onde uma parte briga, se esconde, luta contra a outra, traz o sentimento de não felicidade para que se possa ter o prazer daquela união que se traduz como felicidade. Depois de aprendermos tanto a dividir tudo, a alma amadurece e, como um zíper, vai unindo o que antes ela mesma separou a duras penas. Chega o momento em que o corpo traz as marcas dessa evolução, enquanto a alma em suas expressões vai nos trazendo o alento da unidade sentida em suas profundezas.
A medicina, cuidando do corpo, nos faz crer na possibilidade de agir sobre o destino. As transformações biológicas das rugas, por exemplo, podem ser neutralizadas farmacologicamente impedindo as funções naturais das fibras nervosas, que tentam, a todo custo, escrever em nossas faces quem somos e o que fizemos. Lutamos contra a natureza em seu modo de expressão que não aceitamos.
A psicologia, cuidando da alma, promete evitar o sofrimento e não a dor, pois os alquimistas já diziam que a dor é inevitável, mas o sofrimento é uma escolha. Nutrimos a ideia do encontro com a felicidade, enquanto isso, no giro dos nossos ciclos na vida, vamos percebendo todos os lados de quem circula, o prazer com seu encantamento, o desgosto incomodando e exigindo nossa evolução. Precisamos aprender a não valorizar apenas as notas emitidas durante a execução da música da vida, mas também o silêncio entre elas, pois a melodia resultante dessa forma de relação é que torna possível o verdadeiro sentido da existência.
O futuro nos faz envelhecer, resultado da transformação da prima matéria. Chegamos ao fim de um ciclo em que a consciência de si se sente ameaçada. Cronos agora parece terminar de nos devorar; queremos encontrar a pedra filosofal, o que só é permitido aos amigos da sabedoria. Os ciclos vão se repetindo em nossas vidas e, por mais que seja uma convenção, não podemos ficar impassíveis ante à morte de um ano como este de 2017. Ficamos nostálgicos e logo vem o “Ano-novo”. Gritamos para romper com o luto e festejar o renascer. VIVA 2018!!!
i: Temenos – Palavra grega que significa um espaço sagrado e protegido, onde se realizam as transformações dos alquimistas.
Carlos São Paulo – médico e psicoterapeuta junguiano. É diretor e fundador do Instituto Junguiano da Bahia. Coordena os cursos de Pós-graduação em Psicoterapia Analítica, Psicossomática e Teoria Junguiana.
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